29.11.10


(mais da Bienal)
Enxertos de uma corrida de taxi em São Paulo, com Roberto.
Já disse que adoro os taxistas? rsrs
ô gente que sabe da vida!

Este, por sinal, já tinha trabalhado na cadeia e nos conta:

"As mães chegavam sexta e só domingo é que era dia de visita. Tinha umas que ficava acampada. Umas barraca feito disco voador.
- E porque elas chegavam tão cedo, as mães? - pergunto
- Mãe é tudo besta.
(...)
Que nem uns filhinhos de mamãe... (nós soubemos através dele do atentado punk ocorrido naqueles dias)... viram uns bicha, pegaram uma lampada daquelas fluorecentes e quebraram na cara do coitado.
- teve briga?
- teve nada! De graça!... e a mãe dos meninos falando 'coitadinhos, são umas crianças'. Criança? Isso é crime, boba! Tavam matando o menino de cacete!"

mais tarde... (sabemos... as corridas são longas...)

"E o que vocês acharam da mulher ganhar, pra presidente?
Eu fiquei com dó do Serra... ele queria taaanto ganhar... até votei nele: á cara dele de coitado. Se fosse o Fernando Henrique já tinha aposentado já..."

(Aqui sou obrigada a fazer um enxerto de outro taxista comentando sobre o Serra. Este, o José:)
"O Serra foi um pessimo governador. Faço questão de saber de política...
A sorte é que a Dilma ganhou! Que fique 8 anos e venha o Lula e fique mais 8! É isso que eu quero!
Aqui tem uma radio que chama-se band news, o Boechat é que dizia que o Serra é formado pela faculdade de economia do chile e não sabe contar dinheiro.
Foi governador de um país que é São Paulo e nada ele fez..."

de volta a Roberto, umas pérolas a mais:

"Diabete é assim. Se vc come, dá mal estar. Se não come, dá fraqueza..."

"Mulher é bicho tão bom que até homem quer ser..."
"Quanta mulher perdida. Pena que não pode levar nenhuma pra casa..."
"... Esta é a Gay Caneca, vcs conhecem? Só tem gay aí... depois tem as piranhas. Tem mais de umas 5 mil piranhas aí!
- E fica cheio? - eu, inocente...
- Ô! Mulher, todo mundo quer, né!
...
Aqui tem todo tipo de tribo. Qualquer tipo de praga que vc ve no mundo tem aí."

em tom mais sério, Roberto finaliza a bateria de pérolas:
"Pode ter muita mulher no mundo.
Mas só uma que é sua. As outras são dos outros."

.Não comentei que, embora não risse, vez ou outra Roberto nos alertava que seu tom era de crítica, como quando disse que, com dó, havia votado no Serra.
:)
das melhores corridas
Até quando?


('da inutilidade da utilidade da política da arte', Artur Barrio. na Bienal.)

... outro dia conversava com um amigo... será que em tempo de mulheres no poder, a guerra terá este espaço todo? Não seria esta uma estética masculina?
Convocariam elas, as armas; estas?
...
Seria eu muito romantica?
...

28.11.10

"A regra quer a morte da exceção"

frase extraída do video 'Je vous salud Sarajevo', de Jean Luc Godard
também na Bienal

27.11.10

"Cada pessoa é uma nova exceção
mas os outros nos chamam de nós.
(...)
Cada pessoa é uma outra pessoa
mas todos se chamam de eu."

Gente
Arnaldo Antunes


"Pacientemente, Henry está a espera de uma história na qual ele possa fazer seu lar.
Talvez seu esquecimento seja sua maior virtude. A sua viagem ainda está por ser feita..."

(foto do video 'Um lapso de memória', que amei na Bienal de SP...)

23.11.10



"And in the end
The love you take
Is equal to
The love you make"

(Lennon/McCartney)

... e uma lembrança a mais do show...
inesquecível...:
My Love

e a lista:)
Venus And Mars/Rock Show
Jet
All My Loving
Letting Go
Drive My Car
Highway
Let Me Roll It/Foxy Lady
The Long and Winding Road
1985
Let 'Em In
My Love
I've Just Seen a Face
And I Love Her
Blackbird
Here Today
Dance Tonight
Mrs Vanderbilt
Eleanor Rigby
Something
Sing The Changes
Band On The Run
Ob-La-Di, Ob-La-Da
Back In The USSR
I've Got a Feeling
Paperback Writer
A Day in the Life/Give Peace A Chance
Let It Be
Live And Let Die
Hey Jude
Bis 1
Day Tripper
Lady Madonna
Get Back
Bis 2
Yesterday
Helter Skelter
Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band/The End

14.11.10

"Laço de Papel

Nada vale a dor
Nem mesmo o desatino
Fugir é um alívio que não se dá
Pesado como um trem
Sobre trilhos de vidro
Viver é tão difícil mas vingará

Muda mais um pouco
E aflora pelo rosto
Como um sinal de gravidez
Longe do primeiro mês

Vem, segura a minha sorte
Não viste onde estou brincando?
Não me deixa cair
Senão do chão eu vou além

Amor é como um laço de papel
Atado em cada gesto
Adormecido entre decibéis
Que podem ressonar

Amor é como um laço de papel
Frágil como o céu
Intocável como um véu que faz milagres
Calmo como um quarto de hotel
Sempre a esperar"

Artenius
(Cinza)
cartas de caio

"Você quer escrever. Certo, mas você quer escrever? Ou todo mundo te cobra e você acha que tem que escrever? Sei que não é simplório assim, e tem mil coisas outras envolvidas nisso. Mas de repente você pode estar confuso porque fica todo mundo te cobrando, como é que é, e a sua obra? Cadê o romance, quedê a novela, quedê a peça teatral? DANEM-SE, demônios. Zézim, você só tem que escrever se isso vier de dentro pra fora, caso contrário não vai prestar, eu tenho certeza, você poderá enganar a alguns, mas não enganaria a si e, portanto, não preencheria esse oco. Não tem demônio nenhum se interpondo entre você e a máquina. O que tem é uma questão de honestidade básica. Essa perguntinha: você quer mesmo escrever?Isolando as cobranças, você continua querendo? Então vai, remexe fundo, como diz um poeta gaúcho, Gabriel de Britto Velho, "apaga o cigarro no peito / diz pra ti o que não gostas de ouvir / diz tudo". Isso é escrever. Tira sangue com as unhas. E não importa a forma, não importa a "função social", nem nada, não importa que, a princípio, seja apenas uma espécie de auto-exorcismo. Mas tem que sangrar a-bun-dan-te-men-te. Você não está com medo dessa entrega? Porque dói, dói, dói. É de uma solidão assustadora. A única recompensa é aquilo que Laing diz que é a única coisa que pode nos salvar da loucura, do suicídio, da auto-anulação: um sentimento de glória interior. Essa expressão é fundamental na minha vida.

Eu conheci razoavelmente bem Clarice Lispector. Ela era infelicíssima, Zézim. A primeira vez que conversamos eu chorei depois a noite inteira, porque ela inteirinha me doía, porque parecia se doer também, de tanta compreensão sangrada de tudo. Te falo nela porque Clarice, pra mim, é o que mais conheço de GRANDIOSO, literariamente falando. E morreu sozinha, sacaneada, desamada, incompreendida, com fama de "meio doida”. Porque se entregou completamente ao seu trabalho de criar. Mergulhou na sua própria trip e foi inventando caminhos, na maior solidão. Como Joyce. Como Kafka, louco e só lá em Praga. Como Van Gogh. Como Artaud. Ou Rimbaud.

É esse tipo de criador que você quer ser? Então entregue-se e pague o preço do pato. Que, freqüentemente, é muito caro. Ou você quer fazer uma coisa bem-feitinha pra ser lançada com salgadinhos e uísque suspeito numa tarde amena na CultUra, com todo mundo conhecido fazendo a maior festa? Eu acho que não. Eu conheci / conheço muita gente assim. E não dou um tostão por eles todos. A você eu amo. Raramente me engano.

Zézim, remexa na memória, na infância, nos sonhos, nas tesões, nos fracassos, nas mágoas, nos delírios mais alucinados, nas esperanças mais descabidas, na fantasia mais desgalopada, nas vontades mais homicidas, no mais aparentemente inconfessável, nas culpas mais terríveis, nos lirismos mais idiotas, na confusão mais generalizada, no fundo do poço sem fundo do inconsciente: é lá que está o seu texto. Sobretudo, não se angustie procurando-o: ele vem até você, quando você e ele estiverem prontos. Cada um tem seus processos, você precisa entender os seus. De repente, isso que parece ser uma dificuldade enorme pode estar sendo simplesmente o processo de gestação do sub ou do inconsciente.
E ler, ler é alimento de quem escreve. Várias vezes você me disse que não conseguia mais ler. Que não gostava mais de ler. Se não gostar de ler, como vai gostar de escrever? Ou escreva então para destruir o texto, mas alimente-se. Fartamente. Depois vomite. Pra mim, e isso pode ser muito pessoal, escrever é enfiar um dedo na garganta. Depois, claro, você peneira essa gosma, amolda-a, transforma. Pode sair até uma flor. Mas o momento decisivo é o dedo na garganta. E eu acho — e posso estar enganado — que é isso que você não tá conseguindo fazer. Como é que é? Vai ficar com essa náusea seca a vida toda? E não fique esperando que alguém faça isso por você. Ocê sabe, na hora do porre brabo, não há nenhum dedo alheio disposto a entrar na garganta da gente.
Ou então vá fazer análise. Falo sério. Ou natação. Ou dança moderna. Ou macrobiótica radical. Qualquer coisa que te cuide da cabeça ou/ e do corpo e, ao mesmo tempo, te distraia dessa obsessão. Até que ela se resolva, no braço ou por si mesma, não importa. Só não quero te ver assim engasgado, meu amigo querido.

Pausa.

Quanto a mim, te falava desses dias na praia. Pois olha, acordava às seis, sete da manhã, ia pra praia, corria uns quatro quilômetros, fazia exercícios, lá pelas dez voltava, ia cozinhar meu arroz. Comia, descansava um pouco, depois sentava e escrevia. Ficava exausto. Fiquei exausto. Passei os dias falando sozinho, mergulhado num texto, consegui arrancá-lo. Era um farrapo que tinha me nascido em setembro, em Sampa. Aí nasceu, sem que eu planejasse. Estava pronto na minha cabeça. Chama-se Morangos mofados, vai levar uma epígrafe de Lennon & McCartney, tô aqui com a letra de Strawberry fields forever pra traduzir. Zézim, eu acho que tá tão bom. Fiquei completamente cego enquanto escrevia, a personagem (um publicitário, ex-hippie, que cisma que tem câncer na alma, ou uma lesão no cérebro provocada por excessos de drogas, em velhos carnavais, e o sintoma — real — é um persistente gosto de morangos mofados na boca) tomou o freio nos dentes e se recusou a morrer ou a enlouquecer no fim. Tem um fim lindo, positivo, alegre. Eu fiquei besta. O fim se meteu no texto e não admitiu que eu interferisse. Tão estranho. Às vezes penso que, quando escrevo, sou apenas um canal transmissor, digamos assim, entre duas coisas totalmente alheias a mim, não sei se você entende. Um canal transmissor com um certo poder, ou capacidade, seletivo, sei lá. Hoje pela manhã não fui à praia e dei o conto por concluído, já acho que na quarta versão. Mas vou deixá-lo dormir pelo menos um mês, aí releio — porque sempre posso estar enganado, e os meus olhos de agora serem incapazes de verem certas coisas.

Aí tomei notas, muitas notas, pra outras coisas. A cabeça ferve. Que bom, Zézim, que bom, a coisa não morreu, e é só isso que eu quero, vou pedir demissão de todos os empregos pela vida afora quando sentir que isso, a literatura, que é só o que tenho, estiver sendo ameaçada como estava, na Nova.

E li. Descobri que ADORO DALTON TREVISAN. Menino, fiquei dando gritos enquanto lia A faca no coração, tem uns contos incríveis, e tão absolutamente lapidados, reduzidos ao essencial cintilante, sobretudo um, chamado "Mulher em chamas". Li quase todo o Ivan Ângelo, também gosto muito, principalmente de O verdadeiro filho da puta, mas aí o conto-título começou a me dar sono e parei. Mas ele tem um texto, ah se tem. E como. Mas o melhor que li nesses dias não foi ficção. Foi um pequeno artigo de Nirlando Beirão na última IstoÉ (do dia 19 de dezembro, please, leia), chamado "O recomeço do sonho". Li várias vezes. Na primeira, chorei de pura emoção - porque ele reabilita todas as vivências que eu tive nesta década. Claro que ele fala de uma geração inteira, mas daí saquei, meu Deus, como sou típico, como sou estereótipo da minha geração. Termina com uma alegria total: reinstaurando o sonho. É lindo demais. É atrevido demais. É novo, sadio. Deu uma luz na minha cabeça, sabe quando a coisa te ilumina? Assim como se ele formulasse o que eu, confusamente, estava apenas tateando. Leia, me diga o que acha. Eu não me segurei e escrevi uma carta a ele dizendo isso. Não sou amigo dele, só conhecido, mas acho que a gente deve dizer.

Escrevendo, eu falo pra caralho, não é?"

rsrsrs, ele é demais
passo até mal
Este é, sem duvida o fragmento mais tocante deste tempo
que vivo.
Do Caio Fernando Abreu.

“Mas gosto, gosto das pessoas. Não sei me comunicar com elas, mas gosto de vê-las, de estar a seu lado, saber suas tristezas, suas esperas, suas vidas> Às vezes também me dá uma bruta raiva delas, de sua tristeza, sua mesquinhez. Depois penso que não tenho o direito de julgar ninguém, que cada um pode – e deve – ser o que é, ninguém tem na da com isso. Em seguida, minha outra parte sussurra em meus ouvidos que aí, justamente aí, está o grande mal das pessoas: o fato de serem como são e ninguém poder fazer nada. Só elas poderiam fazer alguma coisa por si próprias, mas não fazem porque não se vêem, não sabem como são. Ou, se sabem, fecham os olhos e continuam fingindo, a vida inteira fingindo que não sabem.

Eu gostaria de ir embora para uma cidade qualquer, bem longe daqui, onde ninguém me conhecesse, onde não me tratassem com consideração apenas por eu ser “o filho do fulano” ou” o neto do beltrano”. Onde eu pudesse experimentar por mim mesmo as minhas asas para descobrir, enfim, se elas são realmente fortes como imagino. E se não forem, mesmo que quebrassem ao primeiro vôo, mesmo que após um certo tempo eu voltasse derrotado, ferido, humilhado – mesmo assim restaria o consolo de ter descoberto que valho o que sou. É muito confortável bancar o infeliz e angustiado quando se vive num bom apartamento, quando se tem um copo de leite quente toda noite antes de dormir, uma mesada no fim do mês e uma mãe que basta estalar os dedos para dobrar-se a meus pés como uma escrava oriental. Ter demais é o meu mal. Se tivesse que batucar numa maquina de escrever todos os dias num escritório cheio de gente preocupada demais consigo mesma para dar atenção aos meus problemas, se tivesse que andar de ônibus superlotados, usar roupas velhas e sapatos furados, então poderia saber se existe ou não essa força que em vão tento encontrar em meu corpo.

Tem sido tudo muito fácil para mim, fácil demais. Às vezes desejo ardentemente que aconteça uma desgraça, uma catástrofe que me jogue ao nível do chão, para me obrigar a despir as máscaras, os falsos gestos, as falsas palavras. Uma coisa que me torne ínfimo, ainda mais confuso e só do que sou, que me deixe a sós comigo mesmo, nu, na frente de um espelho, a investigar a minha verdadeira condição. Então viria a solução final, definitiva. Levantar-me aos poucos, como um pé-de-vento, lentamente crescendo, incorporando outros seres a mim, e girando, girando sempre, tornar-me tormenta, furacão, vendaval, terremoto, cataclismo. OU me dissolveria em poeira à primeira brisa que soprasse – quem sabe?

Fico pensando se viver não será sinônimo de perguntar. A gente se debate, busca, segura o fato com duas mãos sedentas e pensa: “Achei! Achei!”, mas ele escorrega, se espatifa em mil pedaços, como um vaso de barro coberto apenas por uma leve camada de louça. A gente fica só, outra vez, e tem que começar do nada, correndo loucamente em busca dos outros vasos que vê. Cada um que surge parece o último. Mas todos são de barro, quebram-se antes que possamos reformular as perguntas. E começamos de novo, mais uma vez, dia após dia, ano após ano. Um dia a gente chega na frente do espelho e descobre: “Envelheci”. Então a busca termina. As perguntas calam no fundo da garganta, e vem a morte. Que talvez seja a grande resposta. A única.

Parei um pouco de escrever, reli as páginas anteriores até a frase acima. Às vezes, relendo coisas que eu mesmo escrevo, tenho a impressão de que nasceram de um outro Maurício. Um Maurício muito velho, desiludido, amargo. Levanto, vou até o espelho, Investigo meu rosto. Ele não tem rugas, nem sulcos, nem mesmo a sombra de uma tristeza ou dor muito fundas. É um rosto de animal jovem, um rosto de dezenove anos, que ainda não viu nada, não sentiu nada e, principalmente, que não sabe nada. Mas por trás dele, sinto o outro. O Outro que um dia virá a tona, talvez sem sequer anunciar a própria chegada. Nesse dia, levantarei bem cedo e, olhando meus traços refletidos nesse mesmo viro, descobrirei uma luz nova no fundo dos olhos amassados pelo sono. Haverá como uma aura brilhante em torno dos cabelos despenteados, na face que de alguma forma não s era mais a minha, e será definitivamente a minha. “Chegou”, pensarei. E tudo será diferente. Ou não?

Mas enquanto ele não chega vou pingar um ponto final, fechar o caderno, a porta do quarto, chamar o elevador, descer e ficar caminhando horas pelas ruas, ou então me enfiar dentro de um cinema, sem sequer olhar os cartazes ou o nome do filme. Quero ver outras pessoas, outros corpos, outras caras, mesmo que sejam inexpressivos, desconhecidos. Eu também serei inexpressivo e desconhecido para elas, e nesse desconhecimento e nessa inexpressividade mergulharemos todos juntos num filme qualquer, de mãos dadas no escuro, como um bando de meninos dançando a cirandinha.”


...

aos dezenove anos
, no livro Limite Branco

é "o romance de formação de Caio Fernando Abreu" - lê-se na orelha do livro
é a coisa mais viva que tenho lido
INUTIL PAISAGEM

ESPERANZA SPALDING(video)

12.11.10


outro dia vi a Brigitte Bardot num documentário
que coisa, né
e que linda ela

pra sempre

(Brigitte Bardot - La Madrague, 1968)

11.11.10

"Planta colhe
Arnaldo Antunes

o arroz
que se planta se colhe
o amor
que se planta se colhe
o que vai
volta um dia mais forte
o que fica
escondido explode

o feijão
que se planta se colhe
solidão
que se planta se colhe
se fugir
a estrada te escolhe
e o destino
também não dá mole

ao redor
pra onde quer que se olhe
a saída
é uma porta que encolhe
aflição
que se planta se colhe
algodão
que se planta se colhe

se cair
nessa chuva se molhe
sempre há sede
pra dar mais um gole
toda culpa
se planta e se colhe
na garupa
do tempo que corre

cada grão
que se planta se colhe
furacão
que se planta se colhe
cada um
inaugura sua prole
pedra dura
procura água mole

tudo vem
quando o tempo é propício
todos têm
sua porção precipício
o que sabe
não busca sentido
o que sobe
retorna caído

ilusão
que se planta se colhe
confusão
que se planta se colhe
num segundo
o desejo te engole
só não corre
esse risco quem morre"

10.11.10

"ai do acaso
Se não ficar
do meu lado"

Leminsky

9.11.10



por que (não) vermelho (?)

aqui

7.11.10

"Calça saruel é sexy... NOT

ela: como eu estou?*
cara: ta indo pro kung fu?** "

aqui
hehehe

4.11.10

sentir falta de alguém é uma coisa
alguem te fazer falta é outra
"Diante do louco, diante do delirante, não se esqueça de que você é ou você foi analisante, e que você também falava do que não existe.”

Jacques-Alain Miller

2.11.10

Americanos
Caetano Veloso

Americanos pobres na noite da Louisiana
Turistas ingleses assaltados em Copacabana
Os pivetes ainda pensam que eles eram americanos
Turistas espanhóis presos no Aterro do Flamengo
Por engano
Americanos ricos já não passeiam por Havana
Veados americanos trazem o vírus da AIDS
Para o Rio no carnaval
Veados organizados de São Francisco conseguem
Controlar a propagação do mal
Só um genocida potencial
- de batina, de gravata ou de avental -
Pode fingir que não vê que os veados
- tendo sido o grupo-vítima preferencial -
Estão na situação de liderar o movimento
Para deter a disseminação do HIV
Americanos são muito estatísticos
Têm gestos nítidos e sorrisos límpidos
Olhos de brilho penetrante que vão fundo
No que olham, mas não no próprio fundo
Os americanos representam boa parte
Da alegria existente neste mundo
Para os americanos branco é branco, preto é preto
(E a mulata não é a tal)
Bicha é bicha, macho é macho,
Mulher é mulher e dinheiro é dinheiro
E assim ganham-se, barganham-se, perdem-se
Concedem-se, conquistam-se direitos
Enquanto aqui embaixo a indefinição é o regime
E dançamos com uma graça cujo segredo
Nem eu mesmo sei
Entre a delícia e a desgraça
Entre o monstruoso e o sublime
Americanos não são americanos
São velhos homens humanos
Chegando, passando, atravessando.
São tipicamente americanos.
Americanos sentem que algo se perdeu
Algo se quebrou, está se quebrando.

em video

1.11.10