26.2.10

CARTA 67
de Freud a Fliess

"As coisas estão fermentando dentro de mim, mas não conclui nada. Estou mais do que satisfeito com a psicologia: estou atormentado por graves dúvidas sobre minha teoria das neuroses. Minha mente anda muito preguiçosa; aqui neste lugar não consegui acalmar a agitação que há em minha cabeça e meus sentimentos; isso só pode acontecer na Itália.

Depois de ter estado muito satisfeito aqui, estou agora passando por um período de mau humor. O principal paciente que me preocupa sou eu mesmo. Minha leve histeria (muito agravada, porém, pelo trabalho) foi resolvida em mais uma parte: mas o resto ainda está na imobilidade. É principalmente disso que depende o meu humor. A análise é mais difícil do que qualquer outra coisa. E ela também que paralisa minha energia psíquica pra descrever e comunicar o que consegui até agora. Mas penso que deve ser feita e que é uma etapa intermediária necessária em meu trabalho."

[Aussee, 14 de agosto de 1897]
;)

24.2.10

"Ponto de fuga

Depois, tu sairias aéreo pisando no cascalho. Como ser aéreo ao pisar com força a terra? talvez te perguntasses. Mas ao mesmo tempo em que a pergunta nasceria do teu interior, projetada em supresa num impacto que te faria deter os passos - ao mesmo tempo olharias para além da linha do horizonte, ao mesmo tempo para além da areia seca, da areia molhada, do quebrar das ondas depositando formas vivas e mortas na praia, para o primeiro quebrar de onda, espatifao em espuma debaixo do sol, ou talvez do céu escuro, mas se fosse luz, se houvesse luz, a onda quebraria num tremor, espalhada em gotas no ar, no vento, ao mesmo tempo - e tu olharias para o último quebrar de onda, para as ondas que já não quebram mais, para onde já nem existem ondas, para onde só resta o verdeverdeverde inexplicável na sua simplicidade de cor-de-mar-em-dia-claro, ao mesmo tempo olharias para o ponto de encontro entre o mar e o céu. E seria o além. Então procurarias sôfrego por uma palavra, em pânico escavando dentro de ti, pesquisando letras, letras despidas de significado e significante, letras - como um onjeto. Das letras reunidas uma a uma formarias uma palavra para definir esta ânsia de vôo subindo desde o chão até os olhos. Formarias uma palavra, esta: aéreo. NO primeiro momento, serias a palavra, tu serias a coisa, ainda que ali, estático e terreno, pisando sobre o cascalho. Serias aéreo no momento exato em que a palavra se cumprisse em tua boca. Como algo que apenas por um ato de crença, um movimento de fé, se confirma e se consuma - aéreo.
Só depois desse primeiro momento, nenhum segundo, nem uma faixa mínima de tempo: um instante em sua pequenez, máximo na sua amplitude e incompreensão, porque só o incompreensivel é infinito - só depois desse primeiro momento é que te dobrarias para ti mesmo, a palavra latejando na memória, no corpo inteiro, nas mãos contidas, e te perguntarias lúcido - aéreo? Alado, talvez. Pensarias outras palavras, buscando já sonoridades, ressonancias, ritmos, mas nenhuma delas, por mais lapidada que fosse, seria maior que aquela primeira. Nenhuma. Todo perdido dentro do nascido involuntário dentro de ti, caminharias confuso pisando o cascalho.
(...)"

Caio Fernando Abreu

23.2.10

criar um diário
um endereço, um canto
noutro espaço
trouxe solidão pra cá
as referencias se desmarcaram
a voz ganhou corpo
outro

e o corpo está em xeque

entregue às descontinuidades
aos silencios e ausencias
e ao que se apresenta

ouvi outro dia que o bom do caminho é que ele tem voltas
de ida sem vinda basta o tempo

pois bem
habitar o caminho que se traça
experimentar a tortuosidade
nem é tortura
e no entanto
inventar doi

17.2.10

VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA

Manuel Bandeira


Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

13.2.10

O Ferdi tá demais! rsrsr
No blog dele, que já citei umas sete vezes nesta semana, (rsrsrs), encontrei uma grande amiga
amiga
dessas que se a gente quiser parar pra pensar não vai saber nunca que é eu e simone.
que a gente nun-ca se ve, e a gente é super amiga e a gente se ama.haha
:)
achei isso !

"A linguagem é uma pele: esfrego minha linguagem no outro. É como se eu tivesse palavras ao invés de dedos, ou dedos na ponta das palavras. Minha linguagem treme de desejo. A emoção de um duplo contato: de um lado, toda uma atividade do discurso vem, discretamente, indiretamente, colocar em evidência um significado único que é: "eu te desejo", e libera-lo, alimenta-lo, ramifica-lo, fazê-lo explodir ( a linguagem goza de tocar a si mesma); por outro lado, envolvo o outro nas minhas palavras, eu o acaricio, o roço, prolongo esse roçar, me esforço em fazer durar o comentário ao qual submeto a relação."

Roland Barthes

12.2.10

Morning sun


Edward Hopper,
descoberto aqui
“O homem não está destinado a permanecer criança. Ele deixa para trás a infância na época determinada pela natureza: este momento crítico, muito breve, tem conseqüências de longo alcance. Como o ribombar das ondas precede a tempestade, o mesmo acontece com o murmúrio de paixões em sobressalto; uma excitação reprimida nos alerta do perigo iminente.”
Jean-Jacques Rousseau

11.2.10

conversas a vacuo

estava atrás de algo assim
não pensava encontrar tão perto
não sei porque

"Angústia pode ser o desamparo de estar vivo. Pode ser também não ter coragem de ter angústia - e a fuga é outra angústia. Mas angústia faz parte: o que é vivo, por ser vivo, se contrai." clarice lispector

a frase ou a angustia? rs

9.2.10

Este abaixo encontrei aqui, neste site-surpresa


"Muito.
O que ela quer é falar de amor. Fazer cafuné, comprar presente, reservar hotel pra viagem, olhar estrela sem ter o que dizer. Quer tomar vinho e olhar nos olhos. Ela quer poder soprar o que mora dentro, o que não cabe, que voa inocente e suicida. Ela quer o que não tem nome. Quer rir sem saber de quê, passar horas sem notar, quer o silêncio e a falação. Ela quer bobagem. Quer o que não serve pra nada. Quer o desejo, que é menos comportado que a vontade. Ela quer o imprevisto, a surpresa, o coração disparado, o medo de ser bom. Quer música, barulho de e-mail na caixa, telefone tocando. Ela tem muito e quer mais. Quer sempre. Quer se cobrir de eternidade, quer o oxigênio do risco pra ficar sempre menina. Ela quer tremer as pernas, beijo no ponto de ônibus e a milésima primeira vez. Quer cor e som, lembrança de ontem, sorriso no canto da boca. Ela quer dar bandeira. Quer a alegria besta de quem não tem juízo. O que ela quer é tão simples. Só que ela não é desse mundo." Publicada por Pequena

fiquei fã

8.2.10

Aceitando dicas de sites para o 'atalho' aqui ao lado, que daqui a pouco vou lotar de bobagens
:)
/repararam o percentual de diquinhas femininas? rsrsrs/
vamos lá, amigos, compartilhem

7.2.10

"A mulher e a casa

Tua sedução é menos
de mulher do que de casa:
pois vem de como és por dentro
ou por detrás da fachada.

Mesmo quando ela possui
tua plácida elegância,
esse teu reboco claro,
riso franco de varandas,

uma casa não é nunca
só para ser contemplada;
melhor: somente por dentro
é possível contemplá-la.

Seduz pelo que é dentro,
ou será, quando se abra;
pelo que pode ser dentro
e suas paredes fechadas;

pelo que dentro fizeram
com seus vazios, com o nada;
pelos espaços de dentro,
não pelo que dentro guarda;

pelos espaços de dentro:
seus recintos, suas áreas,
organizando-se dentro
em corredores e salas,

os quais sugerindo ao homem
estâncias aconchegadas,
paredes bem revestidas
ou recessos bons de cavas,

exercem sobre esse homem
efeito igual ao que causas:
a vontade de corrê-la
por dentro, de visitá-la."

João Cabral de Melo Neto