26.2.09

princípios de ano...

Ainda em tempo, a mais linda mensagem de princípio de ano que recebi neste 2009 veio de uma amiga especial, que recortou em Neruda, algumas inspiradoras interrogações. Como Ana mesma diz: '' Como o mundo não nos permite muitos sossegos, que nosso ano seja cheio de indagações repletas de importância de vida." :

"É verdade que as esperanças
devem regar-se de orvalho?"

"Por que o tubarão não ataca
as impávidas sereias?"

"Quantas igrejas tem o céu?"

"Que acontece às andorinhas
que chegam tarde ao colégio?"

"É verdade que espalham
cartas transparentes pelo céu?"

"Como agradecer às nuvens
essa abundância fugidia?"

"Como se mede a espuma
que derrama da cerveja?"

"O que ainda paga o Outono
com tanta nota amarela?"

"Quem gritou de alegria
quando nasceu a cor azul?"

"Por que fica triste a terra
quando aparecem as violetas?"

"É verdade que nos formigueiros
os sonhos são obrigatórios?"

"Sabes que meditações
rumina a terra no outono?"

"E quem pediu à Primavera
sua monarquia transparente?"

"Como se chama a flor
que voa de pássaro em pássaro?"

"Amor, amor, aquele e aquela,
se já não são, para onde se foram?"

"Então não era verdade
que Deus vivia na lua?"

"Já pensaste de que cor
será o abril dos enfermos?"

"Por que vivem em farrapos
todos os bichos da seda?"

"Juntam-se todas as lembranças
Dos pobres dos vilarejos?"

"A quem posso perguntar
que vim fazer neste mundo?"

"Por que não amanhece na Bolívia
desde a noite de Guevara?"

"Se todos os rios são doces,
de onde o mar tira o sal?"

"Como sabem as estações
que devem trocar de camisa?"

"Como se chama este mês
que fica entre Dezembro e Janeiro?"

(Pablo Neruda - do Livro das perguntas)

E este post faz com que este espaço fique com mais jeito ainda de depósito de idéias. que é o que ele é. Assim como não chegam mais cartas em papel, também não guardamos lembranças só em caixas de sapato


= )

justiças - por saramago

Justiças

Fevereiro 25, 2009 by José Saramago

No dia de 22 de Julho de 2005, um cidadão brasileiro, Jean Charles de Menezes, de profissão electricista, foi assassinado em Londres, numa estação de metro, por agentes da polícia metropolitana que o confundiram, diz-se, com um terrorista. Entrou numa carruagem, sentou-se tranquilamente, parece que chegou mesmo a abrir o jornal gratuito que havia recolhido na estação, quando os polícias irromperam e o arrastaram para o cais. Não o detiveram, não o prenderam, derrubaram-no violentamente e dispararam-lhe dez balas, sete das quais na cabeça. Desde o primeiro dia, a Scotland Yard não fez outra coisa que criar obstáculos à investigação. Não houve julgamento. A procuradoria impediu que os polícias fossem incriminados e o juiz proibiu o jurado de pronunciar uma sentença condenatória. Já sabem, se algum dia lhes aparecer por aí uma peruca branca, dessas que aparecem nos filmes, digam ao portador o que as pessoas honestas pensam destas justiças.

19.2.09




Gata (Laerte)
"Não gosta de ser definida como fêmea do gato;
é uma fêmea absoluta, acima das espécies
e das estrelas
Curte Luiz melodia
Acredita em Batman
sonha com números
e aposta tudo em sexo bizarro"

Entre gatas (a do laerte e a minha), vou chamar qualquer semelhança de mera coincidência. ; )
'No cio as gatas de pelagem curta mantêm a traseira erguida, miam muito, rolam no chão e procuram insistentemente carinho. As de pelagem longa são mais discretas.
O cio das gatas é prolongado na ausência do macho inteiro, pois a ovulação é induzida pelo coito, ocorrendo à fecundação nas cópulas seguintes.'
no site entendendo seu gato

15.2.09

"O haver

Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
– Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história...

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e do mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.

Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...

Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens."


Vinicius de Moraes,
15.04.1962

14.2.09

cenas do proximo capítulo

" (...)
Greenson decide empenhar todos os seus conhecimentos para ajudar a atriz a ter uma vida normal e voltar a atuar; para isso, no entanto, ele mergulha cada vez mais nas obssessões de Marilyn, e a bela atriz acaba sufocada pelas pressões do estrelato, ' como um afogado que arrasta seu salvador'."
(grifo meu)

da orelha da minha mais nova aquisição: Marilyn, últimas sessões - de Michel Schneider

13.2.09

“O desgaste sem limites da técnica (psicanálise selvagem) acontece por sua “desconceitualização”. A extensão dos limites dessas aplicações não se confunde, todavia, com as variantes do tratamento padrão, titulo irônico e pleonástico: ele assinala que o ato analítico se define dos meios e dos fins, e não pelo enquadre.”

Serge Cottet
no texto O psicanalista aplicado (livro: Pertinências da psicanálise aplicada)

12.2.09

" A gente vinha de mãos dadas, sem pressa de nada pela rua. Totoca vinha me ensinando a vida. E eu estava muito contente porque meu irmão mais velho estava me dando a mão e ensinando coisas. Mas ensinando as coisas fora de casa. Porque em casa eu aprendia descobrindo sozinho e fazendo sozinho, fazia errado e fazendo errado acabava sempre tomando umas palmadas. Até bem pouco tempo ninguém me batia. Mas depois descobriram as coisas e vivem dizendo que eu era o cão, que eu era o capeta, gato ruço de mau pelo. Não queria saber disso. Se não estivesse na rua eu começava a cantar. Cantar era bonito.
(...)
Totoca me deu um puxão. Eu acordei.
- Que é que você tem, Zezé?
- Nada. Tava cantando.
- Cantando?
- É.
- Então eu devo estar ficando surdo.
Será que ele não sabia que se podia cantar para dentro? Fiquei calado. Se não sabia eu não ensinava."

Com estas palavras inicia Meu pé de Laranja Lima, um clássico de José Mauro de Vasconcelos.
E eu, relendo
= )

re-citando

"Forte não parava de falar, parecia estar arrependido de ter mentido antes para mim, parecia que queria se redimir por ter me induzido a crer que ele era um cara mais sinistrão do que o próprio Bin Laden.
Mas nem precisava, eu nunca acreditei em tudo o que eles dizem, nem nas verdades"

MV Bill, no documentário Falcão, Meninos do tráfico, citado por Marcus André Vieira, no livro Restos (muito bom, por sinal)
"Então escrever é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando essa não-palavra - a entrelinha - morde a isca, alguma coisa se escreveu. Uma vez que se pescou a entrelinha, poder-se-ia com alívio jogar a palavra fora. Mas aí cessa a analogia: a não-palavra, ao morder a isca, incorporou-a. O que salva então é escrever distraidamente".

Clarice Lispector

2.2.09

tom zé aplicando zizek : )

"02/02/2009

Roda Viva, TV Cultura. Hoje.

02/02/2009 - às 22h10
SLAVOJ ŽIŽEK
Filósofo e Psicanalista


Professor da Universidade de Lubliana, na Eslovênia, Diretor Internacional do Instituto de Humanidades da Universidade de Londres, Slavoj Žižek é um dos principais teóricos contemporâneos. Navega pelos mais variados cenários intelectuais. Da teoria social para a crítica da cultura, da teoria do cinema para o marxismo, a psicanálise, a política. Nome presente no debate sobre a desintegração dos estados socialistas e sobre o papel da esquerda no mundo atual, Žižek também aborda os dilemas que a globalização e a crise financeira colocam às pessoas e que tanto economistas quanto psicanalistas tentam decifrar. Provocativo, polêmico, Slavoj Žižek constrói um olhar e um pensamento diferente que o destaca na crítica da cultura contemporânia e na análise dos desafios políticos do mundo.

Entrevistadores: Maria Rita Khel, psicanalista e escritora; Laura Greenhalgh, editora executiva dos cadernos Aliás e Cultura do jornal O Estado de S. Paulo; Emir Sader, sociólogo e Vladimir Safatle, professor do departamento de filosofia e do instituto de psicologia da Universidade de São Paulo.

Apresentação: Alexandre Machado

Escrito por Tom Zé às 13h50"


(muitos outros comentários sobre "Arriscar o impossível" - livro do Zizek - feitos pelo Tom Zé, no blog dele.)

vou correr que já vai começar! :)